Aluna da USP Ribeirão Preto que denunciou colega por racismo quer retomar curso: 'Voltar para o lugar que demorei para conquistar'
14/12/2025
(Foto: Reprodução) Estudante acusa colega de perseguição na USP em Ribeirão Preto, SP
Depois de um semestre afastada das aulas por um quadro de depressão, a estudante Priscila Motta da Rocha Antônio, de 21 anos, quer retomar o curso de nutrição na Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto (SP), no próximo ano.
Aluna do primeiro semestre, Priscila reprovou na maioria das matérias porque deixou de acompanhar o conteúdo após episódios frequentes de racismo que sofreu de uma colega de sala. Ela denunciou o caso à universidade.
"Quero muito voltar, não aguento mais ficar dentro de casa. Quero voltar para o lugar que eu demorei tanto para conquistar".
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Em nota enviada à EPTV, afiliada da TV Globo, a USP informou que encaminhou a denúncia à Comissão de Direitos Humanos (CDH) e à Comissão de Inclusão e Pertencimento (CIP), instâncias responsáveis por conduzir a apuração, que segue em andamento.
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O caso ganhou repercussão nesta semana, após a cientista social Jéssica Machado publicar o relato de Priscila nas redes sociais. A jovem afirma que demorou para entender que as provocações que sofria da colega se tratavam de racismo.
"Dava pra ver que eu era a única a ser tratada assim. Ela sempre me desmerecia muito, eu sentia isso e, com o tempo, isso foi me consumindo. Mas eu não tinha ideia do que ela estava fazendo. Foi uma analogia que eu não tinha feito na hora, não tinha levado para esse lado".
Em um dos episódios, Priscila lembra que a agressora disse que ela não poderia sair do grupo de amigas que fazia parte, todas brancas, porque 'era a cota'.
Priscila Motta da Rocha Antônio, estudante de nutrição da USP Ribeirão Preto, SP
Jefferson Neves/EPTV
Segundo a estudante, apesar de denúncias anteriores, o caso passou a ser investigado apenas após o post com a história dela viralizar.
Em um dos comentários de apoio à Priscila, uma jovem afirma que também entrou na universidade pelo sistema de cotas e luta diariamente pela própria permanência na universidade.
"Nossa existência na USP é substancial, é sair da estatística social e mostrar para quem está olhando de fora que também é capaz de estar aqui".
À EPTV, Priscila disse que está com medo, mas feliz com o apoio e o carinho que tem recebido nas redes sociais.
"Estou com medo. Estou com muito medo de tudo. As coisas estão acontecendo muito rápido, coisa que demorou meses para acontecer, está acontecendo tudo nessa semana e estou muito assustada. Mas estou muito feliz com o apoio e o carinho que estou recebendo nas redes sociais".
Post de aluna vítima de racismo na USP em Ribeirão Preto, SP, viraliza
Redes sociais
Racismo em forma de piada
Priscila denuncia que a então colega sempre fazia brincadeiras que acabavam a diminuindo, o chamado racismo recreativo.
🔎 Esta forma de racismo utiliza o humor, a sátira, apelidos pejorativos e 'brincadeiras' para desumanizar, perpetuar estereótipos negativos e discriminar pessoas pretas ou pardas.
Na primeira vez que foi alvo da colega, Priscila conta que as duas conversavam com uma terceira pessoa sobre um curso que ela gostaria de ter entrado.
"Era um curso tecnicamente mais fácil que nutrição. E aí uma menina e perguntou 'você conseguiu passar em nutrição, mas não conseguiu passar nesse curso?' E essa pessoa me cortou e falou 'amiga, é porque ela é cota'. E falou de uma forma pra desmerecer".
Depois disso, segundo Priscila, os episódios se tornaram mais frequentes.
"Teve um episódio que a gente foi estudar na biblioteca, ela me acertou no braço com uma chave e tinha machucado muito. Eu reclamei, tive que insistir muito para ela pedir desculpa, ela pediu desculpa de uma forma super debochada. Teve um caso que ela falou que eu ia casar com um artista famoso preto, porque ele também era cotista".
Priscila Motta da Rocha Antônio, estudante de nutrição da USP Ribeirão Preto, SP
Jefferson Neves/EPTV
Um episódio, em particular, fez com que Priscila deixasse de frequentar a universidade ainda no primeiro semestre. Depois disso, ela não voltou para a sala de aula.
"Teve uma prova e eu pedi para fazer dupla com ela e ela falou 'não vou te carregar, não vou te carregar'. Depois disso, não voltei mais pra faculdade. Tentei voltar no segundo semestre, voltei alguns dias, mas deixei de lado total. Fiquei um mês de cama. Já tinha depressão, só que se intensificou".
Priscila conta que a aproximação das duas começou porque ela se sentia sozinha nos primeiros dias de aula e passou a conversar com a colega de sala, agora denunciada.
"Eu era muito sozinha na faculdade e comecei a andar com essa pessoa. Eu tinha que ser muito delicada, pisar muito em ovos, porque nunca sabia qual seria a reação dela e de que forma ela me trataria".
Após os episódios, a estudante deixou de frequentar a universidade no período e o quadro de depressão, que já existia, se agravou. Agora, com o caso em investigação, ela pede justiça para que consiga retomar os estudos.
"Eu queria o justo, porque perdi um semestre inteiro e foi muito doloroso. Eu ficava trancada em casa, não fazia nada. Só quero que a justiça seja feita. Atualmente, estou tomando sete comprimidos antidepressivos. Meu psicológico foi muito afetado com isso tudo".
A Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, que coordena o curso de nutrição, disse que Priscila foi acolhida com a oferta de acompanhamento psicológico, psicopedagógico e de tutoria acadêmica para reintegração às atividades.
"A FMRP reitera que não tolera práticas de racismo, discriminação ou violência em qualquer de suas formas e reafirma o compromisso institucional com a promoção dos direitos humanos, da equidade e de um ambiente universitário seguro e acolhedor para todas as pessoas".
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